Um ex-soldado, que combateu no Araguaia, reportou-nos que assim que ingressou no serviço militar, em janeiro de 1973, aos vinte anos de idade, foi prestar serviço no Centro de Formação de Artilharia, em Goiânia (Go). Pouco depois, fora designado, juntamente com outros 200 soldados, para a Base Militar de Xambioá, à época Goiás, hoje Tocantins.
Sem inicialmente saber o que de fato iria fazer, e qual seria a missão na região, só quando chegou é que foi ter a dimensão do trabalho que teria pela frente e lá, como muitos outros, passou por humilhações de diversos tipos, praticadas por oficiais superiores. Os relatos sobre esses soldados estão começando a ser contados, como num preâmbulo para a vindoura Comissão da Verdade.
O ex-soldado, que pede para não ser identificado pelo medo de um passado sangrento, relata que toda vez que iria se iniciar alguma missão, a Polícia Federal e o Exército, através dos seus comandantes faziam um amiudado planejamento das ações. Tudo, segundo tal memória, se iniciava apartir destes dois órgãos. Depois de tudo traçado é que eram convocados os outros comandantes da Marinha, Aeronáutica e PMs de Goiás e Pará.
Todos, absolutamente todos, tinham tarefas diante do curso de cada missão.
Os soldados rasos, como eles eram conhecidos e alcunhados pelos oficiais, tinham a missão de fazer sentinela de presos que estavam na base, tais presos podiam ser lavradores suspeitos de serem guerrilheiros ou amigos dos rebeldes ou simples moradores acusados de terem simpatia ao movimento insurgente.
Um outro fator, é que os mesmo soldados faziam a segurança para o alto comando na Base de Xambioá.
Como em toda guerra, os militares têm suas táticas, métodos e práticas e no Araguaia não foram diferentes.
O método mais terrível para elucidar o movimento guerrilheiro era a tortura que vitimou não só os integrantes diretos das Forças Guerrilheiras do Araguaia, mas também, e principalmente, centenas de camponeses pobres que residiam naqueles sertões do Araguaia.
Aqueles soldados que prestavam serviço para o altíssimo comando militar podiam ouvir, dentre outras coisas que, os corpos “dos terroristas” nunca seriam encontrados pois o local onde eles eram enterrados era de tipo muito fundo, sempre na vertical, em cisternas ou poços.
Este dado é absolutamente novo. Por noites e dias, os soldados ouviam as reuniões periódicas dos “doutores” e oficiais. Podiam, inclusive, registrar um medo daqueles tempos manifestados por estreludos generais: caso um desaparecido fosse encontrado, todos seriam.
Acredito, diante da inédita revelação, que o local em que os presos ficavam depois das torturas, na sala do comando, onde era uma cisterna, possa ser o tão falado cemitério clandestino da Base de Xambioá. O ex-soldado informa que este local era muito fundo.
Um tipo diferente de sepultamento pode ter ocorrido no Araguaia, a inumação vertical. Os corpos dos combatentes eram colocados em pé, e/ou jogados em buracos, ficando amontoados, onde eram enterrados, com profundidade ainda não precisa, mas é sabido que estes locais são bastante fundos para dificultar a localização dos restos mortais.
O fato é que tal informação abre, no contexto da reformulação das buscas no Araguaia – sai Grupo de Trabalho Tocantins, entra Grupo de Trabalho Araguaia - o necessário aprofundamento de nossas perspectivas, pois emerge a necessidade de que seja realizada uma investida ainda mais rigorosa nos locais onde já foram realizados trabalhos de escavação.
Falo isso me referindo aos próprios cemitérios da região e as Bases de Xambioá e Bacaba. Introduzo, ainda, a antiga Pastorisa, fazenda onde hoje é a Base de Selva Cabo Rosa.
Nos últimos meses alcançamos avanços no sentido de ouvir ex-soldados dispostos a colaborar, contando o que sabem e presenciaram no decorrer dos combates no Araguaia. Alguns, corajosamente, se reportaram as terríveis operações-limpeza.
Agora, com a reestruturação, com o ingresso do Ministério da Justiça e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, além do próprio Ministério da Defesa, fica mais evidente que o governo de Dilma Roussef quer, de uma vez por todas, resolver a histórica pendência dos desaparecidos políticos brasileiros.
Sentimos, mais do que nunca, que estamos diante de um importante momento para consolidarmos a nossa democracia e a criação da Comissão da Verdade vai nos permitir construir um país diferente, com a consciência de saber erigir seu próprio futuro.
SEZOSTRYS ALVES DA COSTA
Membro do Grupo de Trabalho Araguaia – GTA
Indicação do PCdoB.
Membro do Grupo de Trabalho Araguaia – GTA
Indicação do PCdoB.
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